30 March, 2008

Competência da Justiça do Trabalho para julgamento de ações por acidente de trabalho:

A recente decisão do Supremo Tribunal Federal no Conflito de Competência n.º 7.204, no sentido de ser da competência da Justiça do Trabalho o julgamento das ações por acidente de trabalho, foi bastante comemorada nos meios trabalhistas, sendo qualificada como uma verdadeira "vitória" da Justiça do Trabalho, mais um sinal de seu "fortalecimento" (iniciado, supostamente, pela Emenda Constitucional n.º 45). Mas será que ela é uma vitória também para o trabalhador?

Antes de mais nada, não podemos deixar de registrar a absoluta inconveniência, em termos de segurança jurídica, da persistência dessa controvérsia acerca de qual é a Justiça competente para o julgamento da ação acidentária, quase vinte anos após a promulgação da Carta Constitucional! Em uma ação em que são discutidos direitos fundamentais do trabalhador, intimamente ligados à sua própria dignidade, não se definir sequer qual o juízo competente para o julgamento da ação é algo que compromete sensivelmente a proteção desejada pelo legislador constituinte.

Imagine-se, apenas, quantas ações terão seu andamento sobrestado para serem remetidas à Justiça do Trabalho (isso se o forem), o quanto mais demorará para que elas sejam devidamente autuadas nos órgãos trabalhistas competentes, enfim, quanto se perderá de tempo com trâmites burocráticos absolutamente desvinculados da discussão travada nos autos, apenas porque não se sabe qual o Juízo competente para o processamento da ação?

E a própria insegurança jurídica inerente à possibilidade da orientação do Supremo Tribunal Federal ser novamente modificada, ou, ainda, dela simplesmente não ser seguida pelos tribunais inferiores, e a causa ser processada perante o juízo incompetente até que, depois de muitos anos, o processo todo seja anulado e enviado à justiça tida como competente (qualquer que seja ela)?

Enfim, apesar de sempre termos sido absolutamente contrários à mera cogitação de instituir-se a súmula vinculante, pelo absoluto cerceamento que ela impõe sobre a atividade dos magistrados, será que, em casos como este, ela não poderia ser adotada, em nome da segurança jurídica dos jurisdicionados?

Afinal de contas, o processo, por mais importante que seja, não passa de um instrumento para a efetivação do direito material – na presente situação, porém, muito longe de ser um instrumento, ele tem sido mais um dos inúmeros óbices à realização dos direitos do empregado acidentado. Toda essa discussão tem impedido que o processo possa alcançar sua finalidade – o que nos levou a rever, ao menos parcialmente, nosso desprezo pela súmula vinculante.

De todo modo, não é essa a nossa maior preocupação. Como apontávamos de início, a decisão do Supremo Tribunal Federal foi vista como uma importante vitória da Justiça do Trabalho. Mas será que ela representa uma vitória também para os jurisdicionados, isto é, para o trabalhador acidentado?

De certa forma sim, na medida em que os juizes trabalhistas, por vivenciarem uma realidade diferente daquela enfrentada pelos juizes cíveis, tendem a ser mais sensíveis para com esses tipos de demandas, podendo captar, mais facilmente, as necessidades do trabalhador e, com isso, proporcionar uma melhor proteção aos seus direitos (e dizemos isso sem qualquer demérito aos juizes do cível, mas apenas porque, como apontamos, as experiências pelas quais os juizes trabalhistas passam costumam ser diferentes, o que implica, no geral, em uma diversa sensibilidade sua no trato da matéria social).

Outros benefícios são também apontados, como a maior simplicidade e celeridade do processo trabalhista, o jus postulandi, e a gratuidade de justiça (que também pode haver no cível).

De outro lado, deixa de haver a condenação do empregador em honorários advocatícios (exceto nas raras hipóteses admitidas pela jurisprudência dominante), o que já reduz sensivelmente o valor do eventual crédito do trabalhador.

E, além disso, há também o ponto que mais nos preocupa com relação a essa mudança de competência para a Justiça do Trabalho: a questão da prescrição.

Isso porque, na Justiça Cível, era absolutamente pacífico o entendimento de que as ações acidentárias submetiam-se à prescrição vintenária (agora decenal), ao passo que, com a mudança da competência para a Justiça do Trabalho, começa a surgir a questão de se essas (mesmas) ações não estariam sujeitas, agora, à prescrição bienal (valendo lembrar que as ações de danos morais, que possuem fundamento jurídico semelhante, sujeitam-se também à prescrição bienal, segundo o entendimento amplamente dominante) – já existindo, de fato, decisões nesse sentido, aplicando a prescrição bienal às ações acidentárias movidas perante a Justiça do Trabalho.

Mais ainda, é possível que se queira aplicar a essas ações também a prescrição qüinqüenal, de modo que ainda que o empregado tenha observado a prescrição bienal, caso o acidente tenha ocorrido mais de cinco anos antes da propositura da ação, a matéria não poderá ser apreciada.

A esse respeito, não podemos deixar de registrar que, à primeira vista e salvo melhor juízo, nos parece uma grave impropriedade técnica definir-se o prazo de prescrição de uma ação com base no órgão jurisdicional encarregado do seu julgamento. A prescrição de uma determinada ação, segundo pensamos, deve ser a mesma qualquer que seja o órgão que a julgue (até por ser a prescrição um instituto de direito material, não processual, segundo se entende majoritariamente).

Não nos parece correto que uma determinada ação, em curso na Justiça Cível, submeta-se a um prazo prescricional diferente de uma idêntica ação movida na Justiça do Trabalho – até para que isso não surja como um expediente maliciosamente utilizado pelas partes.

O presente escrito não constitui o espaço apropriado para a discussão dessa complexa e controvertida questão (da prescrição aplicável às ações acidentárias na Justiça do Trabalho) - até porque nosso pensamento a esse respeito não se encontra inteiramente definido. O que nos parece certo, porém, é que há um grande risco dessa mudança de competência voltar-se contra o trabalhador, reduzindo em 80% o prazo da prescrição e, com isso, impedindo o ingresso em juízo de muitos trabalhadores que, na Justiça Comum, ainda poderiam fazê-lo.

Além disso, essa questão pode também dar ensejo ao surgimento de infindáveis discussões sobre a aplicação ou não da prescrição (bienal ou qüinqüenal) às ações já em andamento (especialmente aquelas movidas perante o Juízo Cível), em suma, podendo surgir, com essa modificação de competência, novos óbices à realização do direito dos trabalhadores (com o processo, mais uma vez, transformando-se de instrumento em obstáculo).

À luz dessas breves considerações, nos indagamos: será que essa mudança é boa para aquele que é a razão de ser todo o aparato judiciário: o jurisdicionado (ou será que, em todo esse processo, seus interesses foram deixados de lado)?

Que essa alteração é correta, e que a Justiça do Trabalho é a justiça constitucionalmente competente para o trato da matéria, é indiscutível. Mas será que ela não se voltará contra o trabalhador, impedindo ainda mais a realização de seus direitos sociais? Será, enfim, que essa questão será tratada com a sensibilidade necessária?

Ou será ela, afinal, uma vitória de Pirro?

Rodrigo Giostri da Cunha
Bacharel, especialista e mestrando em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Advogado

Servidor celetista tem estabilidade após três anos

Um servidor público municipal regido pela CLT e aprovado em concurso público assegurou o direito à estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição Federal. A decisão é da 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho.

O servidor — médico do município de Espírito Santo do Pinhal (São Paulo) — deverá ser reintegrado ao emprego e receber salários desde a data da demissão até o efetivo retorno aos quadros da prefeitura, além de todas as vantagens que teria direito se não tivesse sido dispensado. O artigo 41 da Constituição garante estabilidade após três anos de efetivo exercício aos servidores nomeados depois de concurso público.

O médico recorreu ao TST contra decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas, SP). No entendimento da segunda instância, o servidor público, ainda que concursado, não faz jus à estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição.

Para o relator do TST, ministro Emmanoel Pereira, a decisão contraria a jurisprudência da Corte Trabalhista — Súmula 390. O texto prevê que o servidor público celetista da administração direta, autárquica ou fundacional é beneficiário da estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição.

A 1ª Turma não chegou a apreciar o mérito do pedido de indenização por danos morais pelo fato de o TRT de Campinas não ter se manifestado sobre a questão (falta de pré-questionamento).

O ministro Emmanoel Pereira esclareceu que mesmo antes da Emenda Constitucional 19/98, o artigo 41 da Constituição conferia estabilidade após dois anos de efetivo exercício aos servidores nomeados em concurso público.

“Da exegese do artigo 41 da Constituição de 1988, redação atual, pode-se concluir estar assegurada a estabilidade a todos os servidores, independentemente do regime jurídico”, concluiu. A decisão foi unânime.

RR 693.027/2000.4

Revista Consultor Jurídico, 24 de outubro de 2005